quarta-feira, 4 de maio de 2011

Ad amorem

Quando perguntou-me se eu tinha levado comigo « aquele filme com Peter Sellers, The party », como se não lembrasse que foi um dos filmes em que mais rimos juntos, pensei mais uma vez que valeu a pena termos ido cada um para um lado. Juntos, o vimos no mínimo duas vezes. Quem sabe a dor da separação tenha sido tão forte que se permitiu esquecer certos detalhes. Outrora também havia esquecido meu aniversário, quando estávamos bem, ainda. Embora quem sabe já nessa época eu assombrava seus dias, suas noites com a minha impaciência e energia, meus empurrões e impulsividade, estas suas palavras e conceitos que me deixam na dúvida entre envaidecer-me ou sentir-me toda erros. França, o « pays de l’amour ». Amar, amar. Até esquecer-me de mim, efervecer e criar forças para parir-me novamente, não sem amar. E de novo um amor após o outro, antes mesmo de acabar o primeiro. E outro, concomitantemente. Ver chegar a dúvida, a hesitação, a cilada. Sentir-me grande-pequena e com a falsa certeza de crer-me capaz de amar-plural, à fond perdu.

...

não posso mais te escrever meias linhas mudas amor

não posso mais te pensar sem lembrar do antes da dor

não consigo mais querer ser somente teu amor

não consigo mais ser somente tua

mas da tua pele sinto o cheiro e a falta

e falta também outras fazem

agora no vazio de meu quarto

Álvaro de Campos musicado

qual amor evoco ?

...

ápice do pânico

o não querer mais cantar o amor

pintar o amor

derramar versos de temática recidiva

versos falsos

léxico gasto

...

quis toda a emoção

toda a aventura

do lado de cá amplificá-las

agudizá-las em meu canto arisco

carente de cheiros e vozes itinerantes

amar para esquivar-me de mim

protelar-me

...

ao amar-te menos

percebi-me

austera

presa

módica

e ainda queres que continue ao teu lado

na sombra do teu medo

na raiva da tua paranóia

queres que eu fique metade, enquanto ainda não um terço

de alma

alma minha perdida

que sonha futuro e liberdade

...

quando ví a lucidez era tarde

no ainda dia

sinapses etílicas

não mais convenientes

overdose de amor agora

entre bares

as always

meteu-se a pesadelos

facada, perseguição, roubo?

nada poderia ser tão permanente assim mon chèr

estável

menino que não soube reter-me pois volátil

de sua própria dúvida

...

preciso ver-te ainda

amor novo

viver-te

inteira

beber tua verdade

e se fôssemos para longe

sermos nós

e se ficássemos permanecendo

permanecendo-nos clareza

permanecendo-nos satisfação

e mais todos aqueles possíveis

que nos sabem

permaneceríamos?

...

joelhos de velha

casa que queima na noite

pensar algébrico

sempre

dor cativa

muda

o amor, a casa

fica o puzzle

infinito